Espiritualidade & Política

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Fonte: Arquivo pessoal

Existe um grande mito nos dias atuais de que aqueles que trabalham de alguma forma com a espiritualidade não podem colocar em seus discursos suas posturas políticas. Dentro deste mito a espiritualidade e a política não devem se misturar. E colocar em pauta lutas sociais conjuntamente ao exercício da espiritualidade seria, ou desvirtua-la, ou até mesmo cooperar para “trazer baixas energias” a sua prática. Algumas pessoas preferem de fato se manterem neutras, e conduzirem seu trabalho em suas plataformas sociais como se nunca nada acontecesse, para não prejudicar seu próprio engajamento ou perder público. Outras, usando suas vozes, optam por se posicionarem diante do mundo, independente daqueles que irão lhe seguir ou não.

Eu estou aqui como parte do segundo grupo.

Acredito firmemente que se me disponho a desenvolver minha espiritualidade ela não deva ser algo que me capture e me distancie do mundo ao meu redor. Somos seres políticos, vivemos em uma sociedade política, e dar as costas a isso não nos ajuda a sermos mais espiritualizados, apenas contribui a nossa alienação ao nosso meio. Se me coloco no mundo como cartomante e oraculista, disposta a exercer uma escuta ativa do outro e o ajudar em seus dilemas, quem seria eu se ignorasse que as pessoas que me procuram tem contexto e classe social? Quem seria eu se me recusasse a ouvir, de fato, as narrativas dessas pessoas inseridas nas condições sociais em que elas se enquadram? Que curadora seria eu se focasse só nas ditas boas energias quando eu sei que tem muito mais acontecendo?

Quem pode ter, no momento atual, a postura de não consumir más notícias sobre o cenário mundial para não “abaixar a própria energia” já se encontra numa posição de privilégio social muito grande, pois para muitas pessoas isso não é uma possibilidade. Para muitas pessoas as más notícias recheiam suas vidas, elas sendo consumidoras ativas de portais de notícias ou não. A realidade bate na porta de muita gente, não tendo retiro de paz e luz que as regate. Como uma espiritualidade que não quer sujar as mãos com as causas sociais pode ser vivida pelas minorias? Pelas pessoas na periferia? Elas não teriam direito a espiritualidade então?

Como já coloquei neste texto, onde explico um pouco mais da minha visão sobre o que é a magia e sobre o que é a bruxaria, não consigo ter nem sequer bases históricas para dizer que ambas não sejam aliadas a política e também as classes marginalizadas historicamente. A figura histórica da bruxa sempre foi temida por ser aquela que se vivia as margens, e que era perigosa por ser transgressiva, jamais por ser uma aliada conveniente do status quo. E o que temos hoje, no neopaganismo, é um resgate direto desta figura, dessas pessoas. Resgatamos esta posição de resistência, de questionamento, de luta, de forma que busque ser coerente com o mundo atual no qual vivemos. Com seus novos desafios, com suas novas dinâmicas, importâncias e potenciais. Quando deixamos este meio sem a representatividade e o peso político que ele devia ter o matamos em sua essência.

A bruxaria se coloca no mundo atual como um ponto de resistência tanto político como espiritual, onde podemos ter acesso ao conhecimento para criarmos nossa própria autonomia, para dar poder as nossas vozes, para construirmos um mundo melhor. É impossível a conciliarmos com uma postura passiva mediante a opressão, seja ela da forma e no nível que seja. Até porque, como diz a belíssima citação de Desmond Tutu, bispo sul-africano: “Se você é neutro em situações de injustiça, você escolhe o lado do opressor.”

Sejamos contra estruturas espirituais alienantes, nos levantemos contra todo tipo de preconceito. Sejamos antirracistas muito mais do que em nossos discursos, mas também em nossas ações perante nossa sociedade. Apoiemos os movimentos que lutam por igualdade de gênero, sejamos participativos em prol da causa LGBTQIA+ e a favor da liberdade de crença religiosa. Sejamos quem luta contra governos fascistas. Pois como bem se diz nos meios de matriz africana: O melhor ebó pra Orí é ter caráter.

Estudos do Tarot – O Eremita

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A carta O Eremita no Tarot de Rider Waite

Também podendo ser conhecido como O Ancião e O Sábio, na carta O Eremita teremos a sabedoria conquistada através da vivência. É aqui que nos encontramos com a temida velhice, com o peso dos anos, mas também com a inteligência que ela traz. Daquele tipo que só podemos ter, e saber como transmitir, quando já vivemos muito, e nossas experiências nos moldaram na forja da vida.

De todas as formas que temos de o representar hoje em dia, em diversos tipos de baralhos, teremos a repetição dos seguintes pontos em comum:

  • Encontramos aqui uma figura mais velha, predominantemente masculina, apesar de em alguns baralhos também podermos encontrar uma figura feminina.
  • A figura carregará algum tipo de fonte de iluminação, como tochas e velas.
  • Sempre será a carta de número 9.
  • A presença de cores escuras e frias é marcante.
  • Ele, ou ela, estarão frequentemente solitários numa paisagem árida ou numa estrada vazia.
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Diferentes representações da carta O Eremita no Tarot Egípcio, no Tarot de Rider Waite e no Tarot Mitológico (na figura do deus Cronos)

Nesta carta temos aquele que já passou pelas diversas iniciações e fases da vida e que, mesmo depois de tudo que já viveu, nunca deixou de ser a figura do grande buscador de sua iluminação pessoal. Tendo maturidade para sempre reavaliar o que sabe, o que sente, suas certezas e o mundo ao seu redor. Seu percurso solitário, em silêncio, rumo a descoberta das grandezas do mundo e de si mesmo é uma jornada de autoconhecimento. Por isso o vemos solitário em sua estrada, o caminho que ele percorre só pode ser seguido por ele mesmo, pois é uma viagem para dentro de si, de sua própria individualidade, rumo ao seu cerne, e ao cerne do Universo em si.

Seu cajado, ao qual ele usa para ter apoio em seus passos, conota sua já considerável idade. Sua tocha, sua luminária, simboliza sua luz interior, sua sabedoria adquirida. E é com essas duas coisas que ele segue. Por mais árida que seja a paisagem, por mais penoso que seja o caminho, ele segue pois segue em prol de si mesmo, de sua individualidade. De aprender e alcançar o que está além. Do que só encontramos quando nos retiramos do externo para desbravar nossos extensos mundos internos. Assim, aqui temos o movimento de abdicar de tudo que nos é supérfluo e recebemos o foco no que é real e verdadeiro, no mais íntimo de nossas próprias caminhadas e narrativas.

O lado negativo

Como em todas as cartas do Tarot, o Eremita também possui seu lado difícil. Quando temos sua energia em excesso, como é uma carta onde nos movemos muito para nós mesmos, corremos o risco de nos fechar excessivamente ao mundo externo, nos tornando antissociais e reclusos. Podemos encontrar dificuldades em nos expressarmos corretamente, em manter e fazer novas amizades e a gerirmos contatos humanos. Em configurações desfavoráveis é uma carta que pode indicar medo do futuro, mau uso da própria experiência e inteligência, baixa auto estima, processos depressivos e falta de leveza, de jovialidade, no espírito. Aqui, negativamente, encontramos nossa teimosia, nossa rabugice, bem como nossa cegueira a aquilo que nos recusamos admitir, ao nosso redor e em nós mesmos, por causa das nossas cismas e birras.

No amor

O perfil prudente e também fechado em si mesmo do Eremita, para aqueles que já estão em um relacionamento, falará muito sobre a pausa necessária que devemos ter de tempos em tempos para reavaliar nossas dinâmicas. O relacionamento no qual você se encontra hoje é o que você gostaria? Está tudo bem, fluindo devidamente, ou alguns pontos precisam de melhora? Se precisam, como executar essas melhorias da melhor forma? Todas essas são questões muito importantes quando O Eremita está em voga. E aqui não adianta buscar outras pessoas, externas a relação, para conselhos. É você que precisa pensar, se reestruturar, chegar a um acordo com o outro. Ruídos de fora neste momento podem mais atrapalhar do que ajudar. A comunicação precisa ser entre você e seu par, apenas, para que ambos consigam se expressar e se auxiliar, sem pressão externa. Para os solteiros O Eremita não propicia novos encontros. É uma carta que indica uma fase de recolhimento, onde temos que nos cuidar, nos curar de velhas feridas, nos descobrir novamente, antes que possamos nos abrir ao outro.

Na sexualidade

Aqui, na parte sexual do Eremita, é fácil nos remetermos ao prazer solitário.  No entanto, como figura de grande bagagem e experiência na vida, aqui também temos o perfil daquele que sabe o que faz. Não sendo mais um jovem na fase da experimentação, mas sim alguém já vivido que sabe do que gosta, que sabe o que pode oferecer, e como fazer isso da melhor forma, nas mãos do perfil do Eremita teremos alguém que, apesar de poder ser inicialmente tímido, saberá nos conduzir com habilidade. Também sendo um perfil bastante discreto e honesto, tende a ser confiável. No seu jeito comedido, é o típico come quieto. O que acontece entre quatro paredes fica entre quatro paredes.

No trabalho 

Sendo uma carta de movimento lento, no Eremita devemos assumir uma postura um pouco mais prudente. Ouça mais do que fale, reflita antes de agir, pense muito antes de cada passo que der. Não sendo uma carta propícia para se arriscar a coisas novas, para quem procura emprego pode indicar um pouco mais de espera. Essa espera, no entanto, não deve ser parada. Aqui usamos nosso tempo para repensar nossas estratégias e nosso foco. Se existe algo em nossa postura que possa estar equivocada, e por isso não estamos tendo bons resultados. Se reavalie para melhorar! Para quem já está num emprego as coisas tendem a seguir lentamente, porém seguras. Precisamos apenas sermos responsáveis, e saber resolver nossos problemas com calma, sensatez e racionalidade. Financeiramente, se for um período em que uma certa austeridade será necessária. não a tema, seja responsável e siga apenas com o necessário. Se dispa de todo supérfluo e saiba ser uma pessoa organizada e prática.

Na saúde 

No Eremita, por nos encontrarmos com uma figura longeva, temos indícios de uma vida longa, graças a uma boa saúde. Regente dos nossos ossos, o que ele pode indicar são problemas como artrite, artrose, reumatismo, problemas nas pernas e joelhos, nos dentes, e aquelas dores nas costas, no ciático principalmente, comumente associadas a velhice. Aqui pode valer o “pessoa jovem com uma coluna de alguém com oitenta anos”. Em qualquer caso, se cuide apropriadamente, sempre.

Na espiritualidade 

Como figura do grande buscador do seu próprio caminho, no Eremita nos separamos das noções espirituais alheias e nos concentramos em nossa própria jornada em direção ao que cremos e sentimos, com base em nossas próprias experiências. Sua tocha, sua iluminação, proporciona luz apenas a ele mesmo, nos remetendo ao fato de que o que aprendemos e desenvolvemos através do que vivemos serve a nós, e unicamente a nós, de forma intransferível. Claramente podemos compartilhar parte do que experienciamos, e nossa vivência pode contribuir e muito no caminho daqueles que nos olham, assim como muitas das histórias daqueles que seguimos nos enriquece. Aqui não é sobre não poder existir partilha, mas sobre a parte do caminhar de cada um de nós que devemos fazer sozinhos. Onde devemos nos provar, nos desenvolver, de forma única e individual. Nesta camada, a experiência alheia não poderá nos prover tudo, temos que ter nossa própria prática, com suas alegrias e seus dissabores. É aqui que nos tornamos professores de nós mesmos, com o apoio de tudo que construímos ao longo de nossas jornadas, para irmos cada vez mais longe, e com cada vez mais profundidade.

E você? Como anda cultivando sua própria individualidade?

Carta anterior: A Justiça

Próxima carta: A Roda da Fortuna

 

Bem-vindo ao Lunário

Por definição básica, lunários são calendários onde o tempo é computado pela lua e suas fases. Onde nos deparamos com outro ritmo, mais antigo e natural, de se orientar. Pelo movimento das orbes celestes.

E é por esse ritmo, mais instintivo e simples, que procurei guiar meus primeiros passos como estudante tanto do ocultismo e da bruxaria como das artes divinatórias no que hoje em dia já fazem cinco anos.

Tendo me dedicado ao ofício de taróloga pela maior parte desse tempo, venho agora abrir um pouco mais tanto do meu trabalho, como de todo o conhecimento e experiência que adquiri em minha jornada.

Afinal, tudo que precisamos aprender para fluir com os Arcanos é do nosso retorno a nós mesmos e ao ritmo e segredos da natureza que nos cerca.