Existiria como “equilibrar” as Vias Esquerda e Direita?

Fonte: Arquivo pessoal

Se você é um adepto da Esquerda, seja pela vertente que for, você já deve ter visto pessoas levantando as sobrancelhas para você ao ouvirem sobre o seu caminho espiritual. Assim como também já deve ter escutado várias frases sobre equilíbrio. Como se, de alguma forma, a Esquerda fosse sempre algo muito extremo. Muito radical. E discursos sobre moderação, sobre trilhar um “caminho do meio”, e não achar que necessitamos de extremismos facilmente surgem.

São reações que se derivam tanto da falta de conhecimento como também da estranheza que naturalmente a Esquerda sempre provoca. E, como eu também já escutei muito que “não precisamos exagerar” sendo efetivamente de Esquerda, acho importante trazer isso para cá, para o Guia. Afinal, por qual motivo não daria para equilibrar ambas as Vias? Por qual motivo você só poderia trilhar uma delas por vez? Não teria um caminho do meio, uma alternativa mais equilibrada? Bom, vamos começar pelo básico de que:

Nenhuma pretensão de “mesclar” ambas as Vias gera equilíbrio.

A Via Dexterae e a Via Sinistrae já são caminhos equilibrados e completos em si mesmos. E sendo, por natureza, antagônicos em essência. Como já falamos aqui, em nosso texto sobre as definições iniciais. Você pode estar em equilíbrio em um ou estar em equilíbrio em outro.

E, para entender isso, eu gostaria que você pensasse nas Vias em termos de movimento. Imagine que você está no hall de um prédio e existem dois elevadores na sua frente. Um subindo e um descendo. Você conseguiria misturar ambas as direções para que o seu corpo chegasse com maior harmonia em algum lugar? Provavelmente não. Ou você opta por subir ou você opta por descer. O meio termo entre ambos é você não estar indo para nenhuma dessas direções e continuar parado onde você está.

O discurso de se criar de alguma forma um equilíbrio entre as Vias geralmente vem de meios onde não existe um embasamento real sobre a Esquerda. E essa falta de fundamento pode levar os erros do discurso propagado serem desde erros superficiais e mais bobos até a uma ignorância aberta mesmo, e isso sempre descamba para as Vias serem compreendidas como extremos do comportamento humano. Aí o equilíbrio seria você trilhar um caminho onde você ainda será uma pessoa boa (a parte da Direita, a Luz) mas também não sendo trouxa (a parte da Esquerda, a Sombra). Como se na Direita você só fizesse o bem e a caridade e na Esquerda fosse só vela preta, caixão e maldade.

Não é assim. Em ambas as Vias você se desenvolve enquanto pessoa de uma forma completa e harmônica. Você não precisa acrescentar bondade (a Direita) ao caminho da Esquerda porque a Esquerda não equivale a egoísmo e ego inflado. Assim como você não precisa acrescentar malícia (a Esquerda) ao caminho da Direita porque ele não presume em momento algum que você não se defenda e que você seja só bondade até as últimas consequências. Ambos os casos seriam você estar em desequilíbrio na sua própria Via, e não uma necessidade de um pouco da outra.

As Vias não são comportamentos. As Vias são movimento.

Quando você inicia um caminho espiritual você está iniciando uma movimentação do local onde você está no momento para alguma direção. Para alguma finalidade. E nisso, é fundamental que você tenha em mente que:

A finalidade da Mão Esquerda é a individualização e a finalidade da Mão Direita é a universalização.

“Ah, mas o que ambas essas coisas efetivamente seriam, afinal?” Vamos destrinchar!

Universalização

Começando pela Direita, cujo foco está na coletividade e na integração. temos o processo da universalização. E ele é, em si, o retornar ao princípio criador divino, Deus. O alcance da unidade indivisível entre o homem e Deus aqui é tido como o retorno, para a humanidade, do estado anterior a sua queda. Uma condição que é tida como perfeita e eterna.

Todos os caminhos que tenham como objetivo o retorno a um princípio divino do qual nos afastamos e que representa a perfeição de tudo que somos e podemos atingir é, em essência, um caminho pertencente a Direita. Pois, pela Direita, todo sofrimento humano é causado por essa cisão entre Deus, a fonte da Criação, e o homem. O reparando é que retornamos ao que somos em essência, limpos e redimidos de toda mácula causada pela separação.

Dentro do cristianismo, por exemplo, cultivamos esse retorno durante todas as nossas vidas no aperfeiçoamento das virtudes, em oposição aos vícios (pecado). O racional é elevado acima das nossas capacidades emocionais e o ascetismo e a procura pela pureza, negando o material, as paixões e o terreno em prol do lógico e moralmente elevado são tidos como meios para um fim, para que retornemos a união ao princípio divino, externo a nós, e que unifica em si próprio tudo que existe, Deus.

Afinal, as virtudes tidas como uma expressão da centelha divina dentro de nós, do divino que não perdemos, uma expressão do que deveríamos ser, podendo nos guiar até o nosso destino final que é retornar ao estado de perfeição e de graça. De união. Só nesse estado a humanidade progrediria na luz do que verdadeiramente é. Só nesse estado seríamos o que realmente somos e fomos feitos para ser, a imagem e semelhança de Deus. E sim, o processo muitas vezes pode ser tido como rígido, colocando sempre as aspirações do intelecto acima dos instintos e da nossa parte material e carnal, pois a Direita lida com a Ordem. Com a disciplina. E, com isso, traz o processo das leis, da lucidez, das figuras de poder (como o divino), da hierarquia bem definida e de tudo que faz a manutenção da vida em coletivo.

Por mais que existam, e sempre existiram, inúmeras divergências (e até mesmo guerras) entre os próprios cristãos sobre mandamentos, sobre regras e sobre costumes o objetivo final não se perde. Assim como em outros caminhos pertencentes a Direita, o objetivo é retornar ao divino. E esse divino, essencialmente, além de ser compreendido como fonte criadora, também é a imagem de uma perfeição a ser alcançada e nutrida dentro cada um de nós. Pois espelha a nossa natureza nunca perdida, nunca caída, nunca obscurecida.

E, apesar do cristianismo ser um exemplo fácil de caminho pertencente a Direita, existem muitos outros para fora de seus limites. Inclusive, a maior parte do desenvolvimento do Ocultismo, historicamente, sempre foi a Direita. Afinal, Direita e Esquerda são termos pertencentes ao Ocultismo ocidental. E eu me atrevo a dizer que você encontrará figuras muito mais rígidas e intransigentes em seus caminhos espirituais em meio a magos do que dentro das igrejas hoje em dia.

Sendo como for, na Direita a direção que tomamos é para a abdicarmos da nossa individualidade em prol de nos unirmos novamente ao divino, ao Todo, a fonte criadora, a Deus. Deixar o eu individual para trás (a morte do ego que muito é discutida dentro da Direita) é buscado como o meio pelo qual retornaremos a ser um com todo o Universo em sua harmonia. Essa união pode ser vista como uma vida em estado de graça e harmonia perfeita com a fonte criativa ou até mesmo a dissolução da nossa alma dentro desse princípio. Assim como uma gota de água se une ao mar, assim nossas almas se uniriam ao divino, não sendo mais uma em si mas se diluindo ao Todo.

Individualização

Em contrapartida direta a isso temos o caminho da Esquerda, que é externo ao coletivo e ao social, no processo da individualização. Se na Direita abdicamos da nossa individualidade em prol dos interesses do coletivo, o grupo acima do indivíduo, na Esquerda temos as críticas e a oposição a isso. Pois, quando formamos as regras de uma sociedade, essas regras sempre formarão também aqueles que serão marginalizados por elas. E, dentro de uma estrutura rígida, se não existir o embate e a crítica promovida por essas figuras deslocadas também não pode existir melhoria e progresso das sociedades em si. O papel adversarial é fundamental pois sem ele não existe questionamento, movimento e nem evolução.

A Esquerda traz tudo que é considerado tabu pelas normas sociais. Tendo em si uma postura indagadora, que desafia e bate de frente. Nela temos a resistência, o combate, os revolucionários em oposição aos reformistas. A destruição da ordem vigente.

Nela está o selvagem e o indomável pois nela está tudo que não pode ser contido ou controlado pela Ordem. Seja ela a humana ou até mesmo a divina. E, contendo o que está fora dos limites da Ordem, nela temos o caos, nossos medos, nossas fobias, o que nos paralisa, o que nos entorpece e também o que nos tira da nossa razão, nossas paixões, instintos e prazeres carnais. Enquanto na Direita o racional e o lógico é exaltado, tendo que ser cultivado e fortalecido para que o intelecto bem desenvolvido e treinado supere o instintivo bruto, na Esquerda nosso lado bestial é integrado ao invés de ser negado. Pois assim, ao invés de buscarmos nos religar ao divino negando a carne, negamos esse componente divino externo e universal para nos conectarmos a nós mesmos individualmente através da carne.

E essa é a diferença de intenção que precisamos ter em mente. Na Direita temos o desenvolvimento da disciplina, da razão e da virtude como um meio para a reintegração com o divino, que é externo e universal. E na Esquerda o desenvolvimento das nossas capacidades questionadoras e opositivas para nos reintegramos a nós mesmos, a nossa individualidade, aos nossos instintos e paixões para que pertençamos a nós mesmos ao invés de pertencer a algo externo ou ao coletivo. É se voltar para dentro e não para fora. Mesmo que, para que sejamos essa versão pura e natural de nós mesmos, precisemos abdicar de sermos integrados a sociedade e a Deus.

Por isso os bodes expiatórios e os grupos marginalizados estão sempre á Esquerda. Os inconformes, os que não se encaixam, seja por natureza ou por opção. Pois isso é assumir uma postura de negação e de resistência. É ir na direção oposta, fazendo o oposto e tendo a intenção oposta em mente. E, como essa postura é uma postura incômoda socialmente, ela vai causar estranhamento. Ela vai causar desconforto. Sendo isso parte do processo.

Existe uma ligação natural entre a Esquerda e figuras espirituais opositórias não porque elas sejam ligadas as sombras ou sejam trevosas e malignas mas sim porque são elas que compartilham da mesma postura de combate, de serem os questionadores, aqueles que viram as costas e se negam a obedecer e a se conformar, como já falamos sobre aqui. São eles que compartilham da mesma lógica de priorizar sua independência acima de tudo, a portando como uma coroa e também como uma arma. É porque essas figuras não se integram e se opõe a Ordem. É sobre soberania.

Na Esquerda a direção que tomamos é abdicarmos do coletivo em prol de nos unirmos a nós mesmos em essência. É o indivíduo se colocando acima dos interesses do grupo. Quebrando os tabus sociais, negando as expectativas, as normas, se afastando mesmo. Inclusive, e principalmente, quebrando as noções da Direita de hierarquia. E, com essa quebra, também vai abaixo a superioridade dos deuses e a visão de que só seremos bons nos desenvolvendo para nos tornarmos unos novamente com eles. Não existe reintegração de separação ou queda dentro da Esquerda. A Esquerda é disruptiva. Ela busca o rompimento e a destruição da Ordem e não a integração a ela.

A Esquerda rompe paradigmas, desfaz barreiras, muda conceitos e costumes, extrapola propositalmente limites colocados pelas normas sociais e demole velhos sistemas para dar lugar aos seus opostos. Ela não é reformista, tendo em em si a postura de só querer mudar algumas coisas mas preservar outras. Em oposição, é revolucionária. Com discurso e ideias combativas, não deixando pedra sobre pedra em seu caminho. É separativa. Causa cisão ao invés de integração.

E ela é tida como radical por causa disso, não por representar um pretenso mal enquanto a Direita representaria o bem. A dicotomia bem x mal pertence as visões e as filosofias da Direita. Onde a hierarquia muitas vezes precisa da mentalidade nós versus eles para se sustentar. Afinal, nenhum poder dentro de uma estrutura hierárquica gosta de ter a existência do seu posto questionada. É mais fácil colocar o questionador como maligno do que permitir seu questionamento e, em última instância, a dissolução do seu próprio poder. Perceba que não é sobre bondade versus maldade mas sim sobre bater de frente contra estruturas de poder. Sejam elas sociais ou espirituais.

E, por natureza, não existe como você estar de ambos os lados ao mesmo tempo. A favor e contra a estrutura simultaneamente. Isso seria em si uma dissonância cognitiva. Não faz sentido pensarmos em nos unir ao coletivo e a fonte criadora universal enquanto também nos separamos delas. Nem sequer em pensarmos fazer uma dessas coisas fazendo um pouquinho da outra conjuntamente para harmonizar. Não existiria nem sequer coerência ou fundamento nisso.

Ou estamos trabalhando, na nossa jornada espiritual, para nos submetermos e entrarmos em plena harmonia com a Ordem como meio de religar o nosso espírito a fonte criadora, retornando a ela e nos universalizando, perdendo a nossa individualidade em prol da nossa união com o Todo, ou estamos aprimorando a individualização do nosso espírito, focando na nossa liberdade e autonomia, nos separando da Ordem e da fonte criadora para seguir uma existência autônoma por nosso próprio direito e poder.

As Vias são sobre isso. Ou você estamos nos aprimorando para uma finalidade ou para a outra. Não tem como alguém se unir se separando, e nem se separar se unindo. Dessa forma, seguir um desses caminhos necessariamente torna impossível seguir o outro ao mesmo tempo. Saiba para qual finalidade você deseja se dirigir, qual é a Grande Obra que você quer realizar, e se dedique a ela.

Pontos de confusão

Dentro do nosso cenário nacional é relativamente fácil nos depararmos com os conceitos tanto da Mão Direita quanto da Mão Esquerda sendo confundidos, ou mal trabalhados. E é aí que precisamos ter em mente a nossa própria história e contexto cultural. Assim como o quanto que até pouco tempo atrás conhecimento sobre ambas as Vias não era algo acessível no nosso país. O Ocultismo aqui sempre foi um nicho muito pequeno que apenas certos círculos sociais possuíam acesso e contato. E a mudança desse cenário é recente demais. Demais mesmo.

Em relação as Vias, é de comum conhecimento que as suas definições e terminologias tiveram seu início no trabalho da escritora e ocultista russa Helena Blavatsky que, por sua vez, procurou se inspirar nas linhas do Tantra, Vama Marga e Dakshinachara, para criá-las a partir da sua própria visão. No entanto, a Mão Esquerda só despontou como o movimento que hoje é a partir da construção da obra de Anton Szandor LaVey, que fundou a Igreja de Satã (Church of Satan) em 30 de abril de 1966. Mesmo existindo estudos possíveis para levantarmos e discutirmos antes dele foi apenas ali, na gênese satânica, que a filosofia ganhou a vida que hoje conhecemos e entramos em contato. Foi a partir daquele ponto no tempo e espaço que todas as outras vertentes que possuímos, do luciferianismo até a demonolatria moderna, se desdobraram.

Sendo que apenas no ano da morte do próprio LaVey, 1997, tivemos pela primeira vez, pelas mãos de poucos pioneiros, o início das tentativas de trazer o Satanismo para as nossas terras. E, com ele, uma semente de ideia sobre a Mão Esquerda (para contextualizar melhor esse período introdutório em solo brasileiro e quem foram essas primeiras figuras, inclusive com suas posturas políticas extremamente criticáveis, indico o livro História do Satanismo de Morbitvs Vividvs).

Então, do pontapé inicial na década de 60 até o primeiro tímido aceno em cenário brasileiro na década de 90 muito foi produzido, debatido e construído a respeito da Via Sinistrae sem que tivéssemos qualquer tipo de acesso. Ainda engatinhávamos no nível mais básico das ideias de LaVey enquanto o cenário no exterior se desenvolvia a plenos pulmões no início dos anos 2000. Quem esteve nessa época teve que, como dizemos, “abrir caminho no meio do mato com facão”. 

Nenhum livro ou obra era traduzida e lançada de forma oficial no mercado brasileiro. As poucas editoras que publicavam materiais sobre ocultismo e esoterismo em nosso território estranhavam e não possuíam nenhum desejo de trazer nada relacionado a Esquerda para cá. Eram as pessoas que, de forma individual e autônoma, iam atrás de entrar em contato com as Ordens em outros países para buscar contato e possíveis filiações. Os livros tinham que ser importados ou pela própria pessoa ou por quem tinha contatos fora. Materiais na internet e pdfs então eram coisas que só iam começar a se desenvolver depois. Sem nenhuma real variedade, inclusive.

Até o presente momento a Bíblia Satânica nunca foi lançada oficialmente no nosso mercado. Títulos de Esquerda só começaram mesmo a ser lançados por aqui através da iniciativa ferrenha de pessoas do meio que iniciaram suas pequenas editoras independentes do final dos anos 2010 pro começo de 2020. De outra forma, nunca seria feito. Tudo o que possuímos oficialmente em nosso território veio desses anos para cá. É pouquíssimo tempo. As temáticas e os assuntos da Esquerda ainda não tiveram tempo e nem espaço para se desenvolver por aqui. Ainda engatinhamos.

Para se ter acesso a uma vasta diversidade de obras e autores de Esquerda ainda é necessário se ter no mínimo inglês como segunda língua para pegar materiais e obras de fora. O que temos ainda é, em termos gerais, introdutivo. E só o temos pela real paixão, convicção e resiliência dos nossos adeptos, que sempre deve ser celebrada e reconhecida. Pois nosso cenário ainda está em ativa construção. Ainda são poucos os nossos autores e poucas as vozes que estão ativamente trabalhando na construção de conhecimento sobre a Via por aqui. E, por isso mesmo, eu sou tão enfático em ensinar aqui no Guia sobre como estudar, como ir atrás e checar informações, como identificar pessoas e grupos que são realmente sérios e os que não são. Precisamos saber navegar esse meio com critério e discernimento.

Afinal, muitas são as pessoas que, justamente por este não ser um meio plenamente estabelecido e ser um assunto ainda muito novo para as pessoas daqui, espalham desinformações na cara dura sobre a Mão Esquerda e sobre suas vertentes levando muitas pessoas a acreditarem por não terem como checar essas informações com facilidade, nem terem ainda o costume de fazê-lo. Assim como, infelizmente, continua sendo comum você ouvir as maiores atrocidades em centros holísticos de Direita onde a galera parou no tempo nas ideias dos anos 80 e absolutamente ninguém sabe o que está falando quando tentam falar da Esquerda (mas adoram usar a fonte Águas de Lindóia para afirmar coisas que tiraram apenas de dentro das próprias cabeças).

Para entender a Esquerda, ouça e consuma conteúdo de quem realmente é de Esquerda com seriedade. Ouça satanistas, ouça luciferianos. E não quem está fora e é alheio a Via. Essas pessoas nunca terão boas definições ou um real conhecimento para passar fora dos seus achismos. Questione o tempo todo o que chega até você. O questionamento é parte intrínseca da Via Sinistrae. E estude. Estude muito. Estude sempre. Pois é isso que nos faz evoluir em nossos caminhos, é isso que nos dá clareza para separar o joio do trigo e é isso que nos proporciona um caminhar com real confiança e autonomia.

Recomendação de fonte e leitura para aprofundamento do tema: Lords of the Left-Hand Path: Forbidden Practices and Spiritual Heresies de Stephen E. Flowers.

Até mais!

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Atenção: A reprodução total ou parcial deste texto é proibida e protegida pela lei do direito autoral nº9610 de 19 de fevereiro de 1998. Proíbe a reprodução ou divulgação com fins comerciais ou não, em qualquer meio de comunicação, inclusive na internet, sem prévia consulta e aprovação do autor.

A Demonolatria Moderna

Fonte: Acervo pessoal

Como define S. Connolly em seu The Complete Book of Demonolatry, pág. 17: “Demonolatria é uma religião do Eu. (O que significa que trabalhamos para melhorar a nós mesmos). Trata-se de descobrir o poder divino pessoal dentro cada um de nós, vivendo dentro do equilíbrio natural das energias que nos rodeiam (o Universo). Trata-se também de auto responsabilidade e paz interior. Os demônios, para alguns, são simplesmente pontos focais de uma única e pura energia. Para outros, são entidades reais com personalidades e consciências individuais.”

Quando falamos na Demonolatria Moderna falamos de uma religião nova, ampla, diversa e em pleno desenvolvimento onde o equilíbrio e o desenvolvimento pessoal são o grande foco. Nela, os Daemons são despidos de qualquer visão ou conotação cristã para retornarem aos seus postos originais como figuras pagãs cheias de complexidade e força.

O termo começou a ser usado tímida e clandestinamente em alguns meios nos Estados Unidos em meados de 1950/1960 até que, em 1998, oficialmente foi lançada a Guild of Demonolatry que, apesar de agora extinta, foi a responsável por aos poucos tirar prática do armário. Antes dela, muitos praticantes poderiam simplesmente referir a si mesmos como satanistas teístas ou seguidores de algum Daemon específico, sem entrar em muitos detalhes. Hoje em dia, com a proliferação de informações proporcionada pela internet e pelo trabalho de longa data de autores dedicados ao meio (como a S. Connolly!) a temos cada vez mais desenvolvida e bem definida.

Em suas bases temos a procura e a preocupação em se recuperar práticas e crenças que foram marginalizadas pelo cristianismo, além da prática e da comunhão ritual com figuras tidas como adversariais. O trabalho de Richard Dukante é bastante usado e citado, assim como princípios do Hermetismo e do Ocultismo Ocidental são muito usados nas fundações da parte prática.

Nela, não temos as noções de Céu e nem de Inferno como concebidas pelo cristianismo. Alguns praticantes acreditam em reencarnação, outros não. Sendo algo pessoal dentro da visão e da experiência de cada um. Num geral, a ciência é usada e levada em consideração. Principalmente no que se refere a responder sobre de onde viemos e como nosso universo veio a existir e evoluiu.

Adorar Satã é o ponto focal da Demonolatria Moderna?

Não. Dentro da demonolatria Satã geralmente é visto como o Quinto Elemento, ou seja, a fonte e a personificação de todas as outras energias. O temos na materialidade física do mundo ao nosso redor (a Natureza) assim como em nossos próprios instintos e verdadeira essência. Sendo uma das maiores expressões da Corrente do Adversário e um símbolo do Todo, o respeito a ele não inclui uma adoração a ele unicamente voltada. A maioria dos demonólatras foca sua prática pessoal não nele mas sim no seu patrono ou matrona principal, como já falamos aqui.

Por quê Demonólatras e não Satanistas?

Demonólatras não se consideram pertencentes a tradição satânica de Anton LaVey, e nem de suas derivações. Alguns podem adotar a parte filosófica do satanismo para si, mas como uma escolha pessoal e não como algo que faz parte da demonolatria em si. Satanistas Teístas são os que mais podem se aproximar da demonolatria em princípio e prática, mas sempre depende de como cada indivíduo desenvolve a sua práxis. Mesmo dentro da corrente Teísta muitos satanistas ainda tem um certo receio em se afirmar como demonólatras de fato e preferem não reivindicar essa ligação entre as vertentes. Como movimentos que surgiram e cresceram separadamente, apesar de suas intersecções, devemos sempre respeitar a maneira como cada praticante se coloca e as particularidades de cada um dos caminhos separadamente.

Existem rituais de sacrifício dentro da Demonolatria Moderna?

Não. O sacrifício de qualquer animal ou pessoa não é praticado dentro da demonolatria. Muito justamente para se evitar e se distanciar de estereótipos negativos que ainda pesam em cima daqueles que se apresentam como demonólatras. O que não significa que não exista espaço para a prática de blood magic. Mas nela, obviamente, o praticante usa apenas do seu próprio sangue e não do de terceiros.

O que é ofertado então?

Quando nos relacionamos positivamente com os Daemons uma troca de vitalidade e força é beneficamente criada entre ambas as partes. Para além das ofertas materiais que podem ser feitas, a troca energética que ocorre através da convivência é o maior ponto de enriquecimento entre um Daemon e o seu praticante. É através dessa troca que crescemos em nosso caminho, evoluímos e nos desenvolvemos. Aqui o foco não está na ideia caricata da venda de uma alma ou de se ser nocivo a si mesmo ou a outros mas sim no crescimento e no fortalecimento do praticante perante aqueles com os quais ele espiritualmente se relaciona e se entrega.

Mão Esquerda ou Direita

O termo demonolatria, por si, significa adoração aos Daemons. E, quando falamos em adoração, é geralmente a imagem de subserviência a uma força externa que nos vem a cabeça. No entanto, o termo aqui é sempre empregado no contexto em que o temos na Mão Esquerda. Significando que a prática pessoal dos demonólatras é voltada aos Daemons como manifestações da Corrente do Adversário e que seu culto os tem como forças centrais no auxílio do seu próprio desenvolvimento pessoal e não como divindades que estão acima dos seus praticantes.

Lembre-se sempre que na Mão Esquerda não colocamos o divino como estando acima de nós mas ao nosso lado enquanto nos desenvolvemos conjuntamente a ele. Nesta visão, o divino não está separado de nós para que o alcancemos fora mas sim está dentro de cada um de nós. E o desenvolvimento desta centelha divina interna é o foco principal.

Todos somos uma parte do Todo, por isso, não estamos abaixo das figuras espirituais com as quais nos relacionamos, apenas experimentamos um tipo diferente de estado de existência estando no momento dentro de nossos corpos mortais.

Como diz S. Connolly em The Complete Book of Demonolatry, pag. 27:

“Autoconhecimento, auto responsabilidade e auto adoração são partes
da Demonolatria, assim como a busca pelo conhecimento e a prática da adoração aos Demônios. Não nos humilhamos diante dos Demônios como seres indignos que
dependem da ajuda deles para tudo. Eles não nos controlam. Nós controlamos a
nós mesmos. Trabalhamos com os Demônios e os honramos para descobrir nossos verdadeiros
potenciais como seres imperfeitos, mas divinos, ligados a um plano físico de
existência. Ao honrá-los e adorá-los, estamos honrando e
adorando a nós mesmos porque eles são parte de nós, assim como nós somos parte deles.
Todas as coisas são divinas. Não perdemos nosso tempo tentando olhar dentro dos
olhos dos nossos deuses. Em vez disso, trabalhamos para olhar através dos olhos de nossos
Deuses. Basicamente, somos todos a manifestação física do divino. Definimos adoração como reverência e respeito, manter algo em alta conta.”

Então, se você ver alguém achando que ser um demonólatra é se ajoelhar diante de Satã e dos Daemons como superiores, saiba que essa pessoa só está desinformada e se levando pelos estereótipos que aqueles que não fazem parte da religião podem ter sobre ela. Afinal, na Demonolatria Moderna não existe a visão de que estamos abaixo e a mercê dos Daemons mas sim a de que eles são forças que seus praticantes respeitam, confiam e se relacionam em harmonia.

Fontes e leituras recomendadas: Demonolatria Moderna e The Complete Book of Demonolatry de S. Connolly.

Até mais!

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O Espelho Negro

Fonte: Arquivo pessoal

Conhecido como um instrumento de vidência e comunicação espiritual, o espelho negro é comumente usado dentro da Mão Esquerda como um portal para o outro lado. Quando devidamente preparado e utilizado, pode nos auxiliar a atravessar o véu entre o mundano e o espiritual. Sendo uma porta para que nosso espírito possa ir até diversos locais, ou para que espíritos e entidades se mostrem e se manifestem diante de nós.

Enquanto muitos tradicionalmente são feitos sob encomenda, como discos de obsidiana devidamente emoldurados, também é possível que façamos nossos próprios espelhos. E aqui, no texto de hoje, darei alternativas para que você possa fazer o seu próprio espelho negro, assim como um exemplo de consagração e três de utilizações para que você possa desenvolver suas próprias experiências! Vamos lá?

Criando o Espelho

Aqui, o primeiro passo é procurar um bom porta-retratos. Preferencialmente, um que tenha uma boa película de vidro para proteger as fotos. Pois é esse vidro que iremos transformar em um espelho. O tamanho, o formato e o tipo de moldura ficam completamente ao seu gosto. Com ele em mãos, busque também tinta ou fita isolante, ambas pretas.

Pegue a película de vidro e, do lado em que ela estaria em contato com a foto no porta-retratos, a pinte de preto. Ou aplique a fita isolante, para obter o mesmo resultado. Coloque o vidro de volta na moldura, com a parte pintada para dentro. E pronto, você já tem um espelho negro! Se você quiser pintar também a moldura, ou estilizá-la, fique a vontade. Deixe sua criatividade aflorar, afinal, será o seu instrumento personalizado. O da foto que ilustra esse texto, por exemplo, foi pintado de dourado!

Consagrando o Espelho

Indico que essa consagração seja feita durante as luas negra ou nova, de noite. Se você gosta de usar as correspondências planetárias dos dias da semana e horários, você pode fazê-la as segundas, em horários pertencentes a Lua ou a Mercúrio. Então, com o espelho já pronto, escolha a data e o horário em que você fará a consagração de antemão.

No dia e hora escolhidos, faça um chá bem forte de Artemísia e tenha um pano macio e limpo em mãos. Os deixe perto do espelho, no local onde você fará a consagração, e tome um bom banho. Saindo dele, coloque roupas limpas, e comece a ritualística. Faça o Círculo, preferencialmente perto de uma janela ou porta em que você consiga ver o céu noturno. Ou, se você tiver espaço e privacidade para isso, em uma área externa.

Com o Círculo ativado ao seu redor, se sente ao centro dele com o espelho, o chá de Artemísia e o pano a sua frente. Então, chame por Lilith:

“Lilith, neste momento e hora, eu te convido a estar comigo no centro deste Círculo. Guia-me, inspira-me. Que a sua força flua por minhas mãos, por minha mente, através da minha boca. E que aqui eu possa, junto a ti, consagrar este espelho negro como um instrumento poderoso, através do qual um portal se fará entre este mundo e os mundos que estão além.

Que através dele suas grutas sejam acessadas, e que eu viaje sob sua proteção por mundos e dimensões. Que em sua escuridão falem comigo as sombras, espíritos de poderosos mortos, e que aqueles a que eu chamar possam a mim aparecer e se manifestar. Que em sua contemplação eu adquira sabedoria e conhecimento, me desenvolvendo em minha jornada e em meu caminho. Que o abismo eu possa contemplar, e que seus sussurros por mim desvendados possam ser.”

Respire e expire profundamente três vezes, se concentrando no momento presente e no que você está criando. Então, delicadamente, aspirja o chá no espelho, o impregnando com sua energia. Com os dedos indicador e médio da sua mão dominante, então, trace um pentagrama invertido em sua superfície, falando:

“Desperta, venha a vida. Neste momento, te crio. Nesta noite, poder te dou. Que em ti se abram as portas para o incognoscível. Portal para as sombras, ponte entre mim e os planos que estão tanto acima quanto abaixo, entrada para a manifestação de poderosos seres e espíritos. Que através do seu reflexo se mostrem as faces do abismo, sussurrando segredos, desvendando o porvir, e me instruindo em sabedoria e poder.”

Erga-o em direção ao céu noturno e fale:

“Da noite sejas filho, de mim sejas um aliado, e que juntos possamos estar entre mundos, indo de encontro e convidando em comunhão. Pela escuridão que nos cerca, pelo poder que em minhas veias flui e pelas bênçãos de Lilith. Que assim se faça!”

Neste momento, desenhe um símbolo, ou faça um gesto diante dele, que será o código que o ativará e abrirá o portal que ele é. Assim como outro para o fechar. E diga, para ele, que ele só poderá aberto ser quando aquele gesto, ou símbolo, você fizer. Se fechando logo após que você fizer o gesto ou símbolo de bloqueio, depois que terminar seu uso. Limpe e seque-o novamente com o pano limpo e agradeça a ele e presença e o poder de Lilith, encerrando o Círculo devidamente. Se sentir que é adequado, deixe uma oferta a Lilith logo após finalizar seu trabalho. E guarde seu espelho em um local seguro, não deixando que ele pegue sol dali em diante e o usando apenas dentro das suas práticas com cuidado e respeito.

Utilizando o Espelho

O primeiro exercício aqui sugerido será uma forma simples de scrying, ou seja, de divinação usando uma superfície reflexiva. No scrying exercitamos nosso olhar para que possamos olhar através da realidade, e não apenas para ela. Quando olhamos para as coisas normalmente, em nosso dia a dia, olhamos para a vida, mas quando usamos um ponto, como um espelho negro, para olhar através dela, suavizamos nosso olhar para que ele capte outro tipo de conhecimento e acesse outros níveis de existência.

Então, para realizar o exercício aqui sugerido, de noite, preferencialmente de madrugada, pegue seu espelho negro e o coloque em seu altar, ou em um espaço devidamente limpo e separado para isso, entre duas velas. Elas devem estar um pouco atrás do espelho, de forma que sua luz não seja refletida por ele. A cor delas, para este exercício, não é vital, afinal, elas serão usadas apenas como fonte de luz ambiente. Mas você pode usar velas roxas, azul escuro ou mesmo negras se desejar. Deixe a sua disposição também um caderno e uma caneta para anotações.

Faça o Círculo, sente-se confortavelmente diante do espelho, e respire e expire profundamente pelo menos três vezes para se colocar no momento presente. Relaxe os ombros, o maxilar, e se concentre. Faça o símbolo que abre o espelho, dizendo para o que você o abre. Seja obter a resposta de uma pergunta, entender algo, receber um insight ou mesmo se comunicar com algo. Você pode pedir a benção e a proteção de Lilith novamente neste momento, se o desejar.

Então, relaxe seu olhar enquanto observa o espelho, deixando que a experiência flua por si só. O scrying é um exercício contemplativo por natureza. Sendo necessários tanto o relaxamento quanto que você se abra ao processo.

Se você não tem certeza se conseguiu suavizar seu olhar da forma correta a prática experimente colocar um dos seus dedos entre o seu olhar e a tela onde você está lendo esse texto agora. Troque seu foco do dedo para o texto e perceba a sensação produzida. Então, abaixe o dedo e tente olhar para onde ele estava, sem focar no texto. Foque seu olhar neste ponto vazio. Essa é a mesma sensação visual necessária para o scrying. Você terá seu olhar voltado ao espelho, mas, ao mesmo tempo, para um ponto vazio nele, o que te permitirá penetrar na sua escuridão com seu olhar sem dificuldades. Deixando que seus olhos descansem, relaxem, e que a mente se acalme, entrando em transe. É neste estado que as percepções e visões ocorrem.

A maestria vem com a prática, então não se cobre demais no começo. Apenas relaxe e se permita. Ao final, anote suas impressões, sentimentos e percepções. Agradeça, faça o gesto de bloqueio para fechar o espelho, e encerre o Círculo devidamente.

Contatando um daemon

O segundo exercício será para aqueles que desejam um método mais simples e fluido de estabelecer um primeiro contato com um daemon. Sua estrutura é a mesma do primeiro, coloque o espelho negro entre as velas, faça o Círculo, sente-se confortavelmente diante dele e relaxe. A diferença é que, aqui, você colocará o sigilo do daemon entre você e o espelho. Você pode o desenhar, o imprimir, ou o ter confeccionado de outras formas. Só garanta que ele seja de um tamanho apropriado para que você consiga olhar para ele sem esforço e vê-lo bem definido a meia luz das velas.

Procure se concentrar apenas em sua própria respiração por alguns minutos, acalmando sua mente. Então, relaxe seu olhar e observe o sigilo. Tente o observar pelo máximo de tempo possível sem piscar. Com a baixa iluminação, conforme você descansa os olhos e a mente, as linhas do sigilo começarão a sumir e a voltar na sua visão como uma ilusão ótica. Neste ponto, diga suavemente o nome do daemon e peça para que ele venha ao Círculo, junto a você, através do espelho. Então, assim como você fez com o sigilo, olhe para o espelho com o olhar relaxado. Diga o nome do daemon novamente e peça para que você possa o vê-lo e com ele se comunicar. Se acalme uma vez mais, e repita o processo caso seja necessário. Indo da contemplação do sigilo a contemplação do espelho, chamando gentilmente pelo daemon.

Neste processo, você entrará facilmente num transe que dará a sensação de que você está sonhando acordado. Você pode começar a sentir uma presença perto de você, ver ou ouvir algo. Assim que isso acontecer, se apresente educadamente ao daemon e diga o motivo de estar o chamando. A partir deste ponto, procure aguçar seus sentidos para receber quaisquer respostas ou sinais da parte do daemon e estabelecer seu contato com ele. Ao final, agradeça a presença do daemon e peça que ele parta amistosamente, e que exista paz entre você e ele. Faça o sinal de bloqueio para fechar o espelho e abra o Círculo da forma devida. Anote todo e quaisquer sonhos que você tiver nesta noite.

Se aparentemente nada acontecer, mesmo assim agradeça o daemon, peça que ele parta em paz, e feche tanto o espelho quanto o Círculo adequadamente. Não é incomum que, se trabalhar com espelhos for uma novidade para você, seja necessário repetir o ritual algumas vezes até ter resultados satisfatórios. Seja paciente consigo mesmo e vá com calma.

Dê um intervalo de, pelo menos, três dias entre um exercício e outro para não se sobrecarregar. Observe seus sonhos, fique atento a possíveis sinais e, caso você não se sinta seguro em algum ponto, não insista demais. Este não é um método feito para que você obtenha contato por imposição. Então, seja educado e se resguarde.

Na Goetia

A base do primeiro exercício pode também ser usada dentro da Goetia, após o primeiro contato com o daemon ser firmado. Tanto dentro da Goetia Salomônica quanto da Luciferiana, após o primeiro contato ser formalizado entre o praticante e o espírito e ele for ligado ao vaso, ou urna, é através do espelho negro que a comunicação entre ambas as partes continua.

Então, para a prática goetica, faça devidamente o primeiro rito no Círculo, ligue o daemon ao vaso e, após este processo estar feito, utilize o espelho negro para contata-lo, como foi passado no primeiro exercício acima. Neste caso, ao fazer o gesto para abrir o espelho, especifique que está o fazendo para se comunicar com o daemon com o qual você está lidando. Peça para que ele venha até você através do espelho, e que você possa vê-lo e se comunicar com ele apropriadamente.

Aqui, prefira fazer isso sempre um pouco antes de ir dormir. Já que, além do espelho, os sonhos são muito usados pelos daemons para se comunicar com os seus praticantes e podem trazer informações para além do que você conseguiu captar durante o exercício.

Até mais!

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Atenção: A reprodução total ou parcial deste texto é proibida e protegida pela lei do direito autoral nº9610 de 19 de fevereiro de 1998. Proíbe a reprodução ou divulgação com fins comerciais ou não, em qualquer meio de comunicação, inclusive na internet, sem prévia consulta e aprovação do autor.

Resenha – Dicionário dos Demônios de M. Belanger

Fonte: Arquivo pessoal

Na resenha de hoje falaremos de um tomo de peso: o Dicionário de Demônios de M. Belanger, em sua edição estendida em comemoração aos dez anos da obra, trazido para cá pela Darkside! Uma obra indispensável para todos aqueles que se interessam pelo estudo e pela pesquisa do ocultismo e da demonologia.

Ficha Técnica

Autora: M. Belanger

Editora: originalmente publicado pela Llewellyn Publications em território norte-americano e pela Darkside em território nacional

Idioma: Inglês e português

Páginas: 528

Ano: 2021

Sinopse do livro

Conhecimento é poder e proteção. Para compreender a origem do que nos assombra e desafia, nada melhor que mergulhar nos segredos místicos que reinam entre o céu e o inferno. Partindo da premissa de que todo nome tem poder em sua evocação, a pesquisadora do oculto M. Belanger embarca em uma jornada única através de grimórios antigos, originados na Idade Média e na Renascença. Uma pesquisa inédita e surpreendente que foi capaz de reunir a mais extensa lista de nomes e curiosidades sobre o universo da demonologia. Chegou a hora de conhecermos a origem dos anjos caídos e dos demônios mais poderosos e obscuros que já passearam pela história milenar de nosso planeta.

Nesta obra minuciosa, a autora apresenta a mais completa publicação sobre o assunto, reunindo mais de 1.700 verbetes, ensaios e artigos que revelam um panorama amplo sobre as crenças, práticas e eventos da Europa Ocidental que tiveram um impacto direto sobre a religião, além de uma rica pesquisa iconográfica capaz de documentar a representação dos demônios através dos tempos.

Resenha

Ampliando seu conteúdo original de 1.500 para 1.700 verbetes e trazendo uma infinidade de novas curiosidades, informações e artículos, a versão estendida e revisada de Dicionário dos Demônios é um deleite para todos os interessados no tema. Focando, principalmente, em ser uma referência de nomes, com suas histórias e significados, ele se configura tanto como uma boa leitura quanto como um ótimo material de pesquisa para se consultar pontualmente e ter sempre a mão. Como é de seu costume, a Darkside também não poupou na beleza da sua edição, tornando a obra ainda mais visualmente envolvente e ricamente ilustrada. Uma pérola para enriquecer a biblioteca de qualquer demonologista ou ocultista.

Pontos Positivos

Como alguém que passa horas e horas enfurnado em pesquisa como parte da própria prática espiritual pessoal eu digo com tranquilidade que ter um tomo de quinhentas páginas do tipo que o Dicionário de Demônios é não só é útil mas torna as coisas bem mais fluidas. A quantidade de informação que você tem em um lugar só, não precisando se revirar em mil outros livros, poupa bastante tempo. É um livro absurdamente lindo, é recheado de bons artigos entre os verbetes dos nomes demoníacos, e é uma mão na roda. Principalmente para os novatos no tema, que querem começar a pesquisar agora, já poderem começar tendo nele um livro bem estruturado, bem organizado, e abundante em informações.

Pontos Negativos

Aqui o ponto não é exatamente negativo, mas acho importante ser colocado: A pesquisa e o trabalho de M. Belanger focam quase que exclusivamente na cultura, no folclore e nos grimórios da Europa Ocidental. Se você procura sobre a mitologia e os demônios de outras regiões é bom procurar, conjuntamente, outras fontes. Ele não deixa de ser um livro interessante por causa disso, mas não foca seu trabalho e suas minúcias para outros cantos do mundo.

Acessibilidade: Como sabemos, preços da Darkside podem ser bem salgados e nada acessíveis para muitas pessoas. Principalmente no caso de um livro grande como esse é. Eu não encontrei, até agora, pdfs da versão traduzida dele. Apenas da versão original, sem ser a estendida, e em inglês. Se você tiver uma noção básica da língua, pode procurar. Mas, de qualquer forma, lembro sempre que o que eu falo sobre pdfs aqui é para quem realmente não tem condições. Se você tiver como comprar o livro, compre. Não só vale muito a pena, mas sinto que é bem melhor consultar um livro desse tamanho em formato físico do que em digital.

Até mais!

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Atenção: A reprodução total ou parcial deste texto é proibida e protegida pela lei do direito autoral nº9610 de 19 de fevereiro de 1998. Proíbe a reprodução ou divulgação com fins comerciais ou não, em qualquer meio de comunicação, inclusive na internet, sem prévia consulta e aprovação do autor.

Quem são os Daemons?

Fonte: Asmodeus, como ilustrado no livro Dictionnaire Infernal de Collin de Plancy – Edição e arquivo pessoais

Quando, na Mão Esquerda, falamos sobre daemons, é um lugar comum que a primeira reação seja a do medo e da desconfiança. E não é de se estranhar, quando levamos em consideração que a nossa cultura foi e ainda é moldada pelo pensamento e pelo imaginário cristão. Toda ideação que formamos sobre esses seres é e sempre foi, em si, muito caricata. E falar sobre eles acaba sendo também falar sobre história, sobre como a nossa sociedade evolui certos conceitos, sobre o que ela perseguiu, o que ela renegou, e sobre uma miríade de povos que tiveram o olhar desvirtuado e colonizador europeu sobre suas crenças e sobre suas próprias figuras mitológicas.

Pois, a classe de seres que hoje chamamos de daemons, provém de um rico caldo cultural formado pela religiosidade da Europa Ocidental que, em si, bebeu vastamente de elementos helênicos e romanos e se apropriou de muita coisa proveniente da cultura judaica e do antigo Oriente Médio num geral. De forma que aqui, neste texto, eu não tenho nenhuma pretensão de esgotar o tema, visto que isso seria inviável pela sua vastidão. Mas sim, de propor uma luz inicial.

Como já citado em nosso texto sobre apadrinhamentos, que você pode ler aqui, é importante saber que a visão que temos na Esquerda sobre esses seres difere muito da visão cristã. Até mesmo por uma questão de conceitos iniciais. A palavra que usamos de forma tão comum, demônio, é uma variação em latim do termo grego daímôn, que era usada para se referir a seres semidivinos de natureza neutra, e não apenas maligna como podemos ser levados a crer.

Estes seres eram complexos, multifacetados, e poderiam estar associados a natureza ou a certas facetas do temperamento humano, fazendo a ponte e a intermediação entre nós e o espiritual. Seu papel, na cultura grega, difere muito do papel dos demônios dentro do cristianismo. No entanto, foi o termo que foi apropriado para abrigar, dentro de si, uma infinidade de seres, espíritos e divindades de diversas culturas para que elas sofressem um processo que, hoje, chamamos de demonização. O processo de descaracterizar algo para o tornar ruim, negativo e pejorativo.

A beleza da expressão religiosa de diversas culturas e grupos, com seus ricos costumes e práticas, foram completamente engolidos neste processo. Transformados em coisas que nunca foram inicialmente. Tirados de seus lugares e contextos para sofrer uma distorção vulgar e extremamente preconceituosa. Um processo que aconteceu por milhares de anos e, em muitas instâncias, ainda acontece. Fruto do mesmo velho medo de reconhecer o outro como humano, e não como um vilão maquiavélico, simplesmente por esse outro possuir crenças e costumes diferentes dos nossos.

É nisso que vemos muitos dos 72 daemons da Goetia, por exemplo, serem versões deturpadas de divindades pagãs de diversas culturas muito antigas. Colocados como menores por pura rivalidade. Afinal, as forças que abençoam aqueles que vemos como nossos inimigos não seriam, elas mesmas, malignas a nós?

A situação piora bastante se essas forças não são descritas, dentro de suas culturas, como apenas benignas mas sim como figuras complexas. Num pensamento dicotômico, onde as coisas devem ser apenas boas ou apenas más, existe pouco espaço para nuances. E assim o pensamento sobre muitos seres foi não apenas deteriorado como também simplificado até os tornar indistinguíveis do que originalmente eles eram.

Sempre existiu riqueza e encantamento no mundo. Na maneira como nossa espécie lidou e traduziu as forças ao seu redor. Forças complexas, cheias de mistério e poder. Forças que eram encontradas tanto nas chuvas que vivificavam o solo quanto nas tempestades que o arrasavam. No movimento dos astros no céu e na força das marés. Nos desafios impostos pelos desertos e espaços áridos com seus predadores e nas bênçãos dos oásis e dos campos frutíferos. Uma complexidade que, ao longo da história, foi de pouco em pouco desvalorizada e saqueada. Mas que ainda está lá, nos meandros daquilo que deixamos para trás. E que pode ser recuperada através das mãos que se dispõe a esse trabalho. Dentro da Mão Esquerda, passando também por uma ressignificação. Onde não só nos dedicamos a pesquisar esses processos históricos mas também a olhar para esses seres sobre novas óticas, nos desfazendo dos medos e dos preconceitos que a eles foram adicionados. E nos permitindo sair da velha dicotomia para que uma visão mais complexa, com suas nuances e sua diversidade, possa voltar a tona onde é devida.

Temos, dentro da demonologia, relações muito profundas, que afundam na história, de trocas culturais, sincretismo e disputas. As encontraremos, naquilo que herdamos, majoritariamente vindo das relações entre as culturas suméria, babilônica e judaicas. Assim como o peso dos processos europeus, com suas releituras, seus folclores regionais, suas idas e suas vindas. De forma que, para cada nome demoníaco que chegou até nós hoje em dia, podemos traçar as linhas históricas mais complexas e diversas imagináveis.

Mas podemos, também, as estender a todas manifestações culturais e religiosas da humanidade. Onde sempre teremos, não importa em qual local ou época, seres que trazem e representam forças consideradas adversárias. Sendo assim vistas por estarem associadas a manifestações naturais agressivas a vida ou, pior ainda, a sociedade ao lado que rivaliza com a nossa. Afinal, o fator social sempre se entranha na figura do adversário, muitas vezes indivisivelmente. Colocando as figuras que representam os medos que sentimos do escuro muito próximas do medo que sentimos do outro. Do diferente. Do que não se encaixa. Do que questiona e trás consigo revoltas por isso.

Tornando, assim, as figuras espirituais que trazem e representam essas questões seres extremamente intrincados e multifacetados. E que merecem assim tratados ser. Não como seres que são apenas isso ou apenas aquilo, mas sim como manifestações plurais e ricas daquilo que nos desafiou ao longo dos conflitos e da evolução de nossa história. Como chamas representantes do que a Corrente do Adversário realmente é. Aquilo que nos desafia, que nos testa, e que traz, através de seus dilemas, nossas oportunidades de aprendizagem e crescimento.

Eles são todos os seres catalogados como antagonistas. Tanto por serem aqueles que trazem as forças contrárias da natureza, como Pazuzu, rei dos demônios do vento mesopotâmico, que trazia consigo a simbologia das estiagens e da fome proporcionada pelas estações secas, mas que também protegia mulheres grávidas e desviava daqueles que o chamassem a dor de diversas doenças que eram atribuídas a ação dos ventos provenientes do oeste, quanto aqueles que foram demonizados ao longo dos processos históricos que sofreram, como Baal, um dos principais deuses fenícios, que regia o clima, a fertilidade, a guerra e as tempestades, sendo um grande senhor dos céus.

Pazuzu, em sua cultura original, sempre teve em si a conotação de ser uma força agressiva, capaz de destruição tanto quanto de conferir proteção, enquanto Baal foi colocado em uma posição cada vez mais antagônica politicamente através da história. Até termos, derivado dele, o Bael goetico, por exemplo. Hoje em dia, ambos representam forças demonizadas por nós. E, se interessar por eles, é aprender o caminho que eles traçaram junto aos povos pelos quais percorreram. E é lidar com as dificuldades, testes e desafios que eles trazem. Não só através das suas conotações originais, mas também do que eles adquiriram com o passar dos séculos. É aprender com as suas complexidades. Desatando os nós do intrincado novelo histórico ao qual eles foram atados. Os tirando de uma visão simplista de algo apenas maligno sem que, para isso, precisemos os colocar também como apenas benignos. Dando lugar novamente a uma composição e uma visão mais profunda e plural.

Nisso, lidar com eles, assim como lidar com quaisquer figuras que integram a Corrente do Adversário, é uma tarefa que requer muito comprometimento e muita seriedade. Não só em estudo e pesquisa, que são sempre e constantemente necessários, mas em uma entrega a forças que transformarão quem somos em essência. Afinal, escolher dançar com demônios sempre é escolher dançar com as nossas próprias sombras. Tanto pessoais quanto coletivas. Em meio aos pálidos escombros formados pelos conflitos e pelas guerras que nossa espécie deixou e ainda deixa em sua jornada através deste universo.

Até mais!

Fonte e indicação de leitura: O dicionário dos Demônios de M. Belanger

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